Meu sangue engrossou. Coagulou dentro das veias e artérias. Está preto. Minhas veias até tentaram aumentar o calibre para ele passar. Em vão, ele quis ficar. A pasta em que se transformou espera as respostas serem enviadas pelo cérebro. As respostas das inúmeras perguntas que chacoalham como um carro baixo em uma rua esburacada precisam de um passeio estável para alinharem-se. As perguntas estão em frequências diferentes. Não pertencem à mesma escala musical.
Por hora espero o sono chegar para ver se durante o descanso consigo acalmar meu coração. Fazer ele voltar a bombear aos poucos. Mililitro por mililitro dos cinco mil que estancam o gás carbônico de ser expelido. Entenda, é por você que me desespero.
domingo, 24 de julho de 2011
quinta-feira, 2 de junho de 2011
Aquele do cara que nunca dorme. Parte um ou única.
Completos os vinte primeiros anos de vida de forma discreta, sempre foi mediano. Aluno médio. Beleza média. Humor médio. Até o dia do acidente. Estava só no carro, bebeu uma cerveja a mais e encontrou a árvore na avenida principal do caminho para casa. Quem viu o acidente e o resgate garantia que ele nunca mais abriria os olhos. Se o fizesse, nunca recuperaria os sentidos normais. Impossível sair sem sequela alguma. As previsões estavam absolutamente corretas.
No quarto escuro do hospital com ela rezando ao lado da cama, abriu os olhos. Um alvoroço foi instaurado. Todos da equipe médica checaram uma por uma de suas funções. Sentia as pernas. Via com clareza. Ouvia e falava perfeitamente. Sentia o odor do Éter usado na esterilização do ambiente. Lembrava seu nome, lembrava que o dela começava com "L". Lembrava a soma entre dois números. O ano que o Brasil fora campeão da Copa do Mundo. Lembrava inclusive a escalação. Ainda não sabia, mas sua memória se tornaria um marco.
Um dia inteiro de exames e festas dos amigos e familiares. Todos o visitavam. Queriam ver o milagre acontecido. Todos impressionavam-se, além da cicatriz escondida pelo cabelo na parte lateral da cabeça, nada. Nada, mesmo. Nem um risco sequer para que alguém acredite que ele estava em um acidente tão bruto. Mais alguns exames. Todos horrivelmente normais. No ano de 1995 os carros não tinham tantos recursos de segurança. O dia passou numa velocidade estonteante. Talvez por ter acontecido tanta coisa. Chegou a noite. As horas simplesmente andavam. O sono não chegava. “Vou dar-lhe um pouco mais de anestésico.” disse o médico. Ineficaz como um guarda chuvas em dia que caem canivetes. Já passam das duas da manhã. “Deve ser a excitação” especula o de branco.
Aos quarenta e seis anos, (os vinte e seis já passaram, pela mesma preguiça que bateu no autor da bíblia), ele ainda não dormiu. Descobriram em um exame invasivo, que houve um dano irreversível no cérebro. No começo acharam que morreria de estafa física e mental. Simplesmente não aconteceu. As funções vitais mantinham-se intactas. Sem perda de memória. Sem alteração nas taxas hormonais. Um horror biológico. Aproveitou para fazer tudo. Graduou-se em nove cursos diferentes. Das mais diversas áreas do conhecimento. Trabalhava mais que todos. Possui um relógio biológico invejável, exceto pelo sono. Parou de beber e treinou bastante, o que lhe tornou um exímio motorista. Casou-se com ela, e sempre teve tempo para a família. Cuidava de tudo que podia. Viajou o quanto pode, afinal, seu corpo nunca cansava. Tinha um problema sério em sua vida. A evolução surreal da maturidade. Aos vinte e cinco pensava como se dez anos mais velho fosse. E assim sucessivamente em progressão geométrica.
O único desgaste que sentia era psíquico. Não suportava o tédio. Não havia mais filme que o entretece. Livro que o interessasse, ou música que nunca ouvira. Todos os tipos de trabalhos manuais era um perito. Marcenaria, fundição, luthieria. Era exímio músico em vários instrumentos. Nada o interessava. Apenas sua família. Viveu os últimos 5 anos em função deles. Sabe que não será imortal, os anos passaram em sua pele. Já não tem mais a rigidez cutânea que tinha. Os cabelos mudaram de cor. Apenas um hábito não mudou. Todos os dias, durante o banho matinal, passa o shampoo no cabelo, sente a cicatriz com a ponta dos dedos. E sonha acordado com conseguir dormir novamente. Sonha com o dia que um sonho volte a acontecer. Sonha em dormir, nem que seja na morte.
No quarto escuro do hospital com ela rezando ao lado da cama, abriu os olhos. Um alvoroço foi instaurado. Todos da equipe médica checaram uma por uma de suas funções. Sentia as pernas. Via com clareza. Ouvia e falava perfeitamente. Sentia o odor do Éter usado na esterilização do ambiente. Lembrava seu nome, lembrava que o dela começava com "L". Lembrava a soma entre dois números. O ano que o Brasil fora campeão da Copa do Mundo. Lembrava inclusive a escalação. Ainda não sabia, mas sua memória se tornaria um marco.
Um dia inteiro de exames e festas dos amigos e familiares. Todos o visitavam. Queriam ver o milagre acontecido. Todos impressionavam-se, além da cicatriz escondida pelo cabelo na parte lateral da cabeça, nada. Nada, mesmo. Nem um risco sequer para que alguém acredite que ele estava em um acidente tão bruto. Mais alguns exames. Todos horrivelmente normais. No ano de 1995 os carros não tinham tantos recursos de segurança. O dia passou numa velocidade estonteante. Talvez por ter acontecido tanta coisa. Chegou a noite. As horas simplesmente andavam. O sono não chegava. “Vou dar-lhe um pouco mais de anestésico.” disse o médico. Ineficaz como um guarda chuvas em dia que caem canivetes. Já passam das duas da manhã. “Deve ser a excitação” especula o de branco.
Aos quarenta e seis anos, (os vinte e seis já passaram, pela mesma preguiça que bateu no autor da bíblia), ele ainda não dormiu. Descobriram em um exame invasivo, que houve um dano irreversível no cérebro. No começo acharam que morreria de estafa física e mental. Simplesmente não aconteceu. As funções vitais mantinham-se intactas. Sem perda de memória. Sem alteração nas taxas hormonais. Um horror biológico. Aproveitou para fazer tudo. Graduou-se em nove cursos diferentes. Das mais diversas áreas do conhecimento. Trabalhava mais que todos. Possui um relógio biológico invejável, exceto pelo sono. Parou de beber e treinou bastante, o que lhe tornou um exímio motorista. Casou-se com ela, e sempre teve tempo para a família. Cuidava de tudo que podia. Viajou o quanto pode, afinal, seu corpo nunca cansava. Tinha um problema sério em sua vida. A evolução surreal da maturidade. Aos vinte e cinco pensava como se dez anos mais velho fosse. E assim sucessivamente em progressão geométrica.
O único desgaste que sentia era psíquico. Não suportava o tédio. Não havia mais filme que o entretece. Livro que o interessasse, ou música que nunca ouvira. Todos os tipos de trabalhos manuais era um perito. Marcenaria, fundição, luthieria. Era exímio músico em vários instrumentos. Nada o interessava. Apenas sua família. Viveu os últimos 5 anos em função deles. Sabe que não será imortal, os anos passaram em sua pele. Já não tem mais a rigidez cutânea que tinha. Os cabelos mudaram de cor. Apenas um hábito não mudou. Todos os dias, durante o banho matinal, passa o shampoo no cabelo, sente a cicatriz com a ponta dos dedos. E sonha acordado com conseguir dormir novamente. Sonha com o dia que um sonho volte a acontecer. Sonha em dormir, nem que seja na morte.
domingo, 29 de maio de 2011
A porta.
A porta automática abriu quando por sensores notou sua presença. Passou a portaria, entrou no elevador. Pediu pelo quarto andar ao ascensorista. Entrou na sua baia. Pousou o paletó no gancho ao lado da mesa em forma de “L”. Começou mais um dia de trabalho. Fez duas ligações. Notou que, mais uma vez, furtaram sua caneta. “Absurdo” pensou, “meu nome estava escrito nela”, completou. Checou o e-mail da empresa. Pouco mais de dez mensagens. Checou o de uso pessoal. Zero. Resolveu as pendências até o meio dia. Desceu para o almoço.
A porta automática abriu quando por sensores notou sua presença. Resolveu ir ao outro restaurante. Não àquele que vai diariamente, mas o mais caro. Olhou a carta e pediu lagosta. Comeu o suficiente, pediu café curto e conta. A porta automática abriu quando por sensores notou sua presença. Pediu o quarto andar. Checou novamente o e-mail pessoal. Zero. Checou o profissional. Dois. Resolveu o que faltava. Olhou quando ela passou. Olhou através da janela alguns metros à direita. Sua baia é central.
Telefonou de seu celular para o serviço de acompanhantes. Pediu a de sempre, mas com um extra. Que trouxessem-lhe um bolo. Pegou o metrô. Abriu a porta de casa, a geladeira e uma cerveja. Sentou-se junto da TV e assistiu ao noticiário, enquanto esperava sua “encomenda” e lembrou que no momento em que porta automática abriu quando por sensores notou sua presença pensou ter ouvido-a falar “feliz aniversário”
A porta automática abriu quando por sensores notou sua presença. Resolveu ir ao outro restaurante. Não àquele que vai diariamente, mas o mais caro. Olhou a carta e pediu lagosta. Comeu o suficiente, pediu café curto e conta. A porta automática abriu quando por sensores notou sua presença. Pediu o quarto andar. Checou novamente o e-mail pessoal. Zero. Checou o profissional. Dois. Resolveu o que faltava. Olhou quando ela passou. Olhou através da janela alguns metros à direita. Sua baia é central.
Telefonou de seu celular para o serviço de acompanhantes. Pediu a de sempre, mas com um extra. Que trouxessem-lhe um bolo. Pegou o metrô. Abriu a porta de casa, a geladeira e uma cerveja. Sentou-se junto da TV e assistiu ao noticiário, enquanto esperava sua “encomenda” e lembrou que no momento em que porta automática abriu quando por sensores notou sua presença pensou ter ouvido-a falar “feliz aniversário”
segunda-feira, 16 de maio de 2011
Quando o céu deixa de ser azul.
Passei um tempo sentado junto ao batente da porta. Vi os tons em azul mudando. Um tempo que passou sem eu sentir. Ontem eu também estava sentado no mesmo lugar. Minha casa era basicamente a mesma. Minha vida completamente diferente. Nos dez anos que passaram de ontem para hoje perdi e ganhei tempo. Ontem tinha um outro cachorro deitado olhando para o portão. Hoje fumei enquanto esperava o tempo passar. Nem lembro mais sobre o que pensava tanto. Talvez nada que mereça a recordação. Mas de certa forma eu tenho saudades de como fui ontem.
Quando pensei o quanto minha vida mudou em um dia foi que vi o tempo que durou. Hoje já não me espanto tanto com o outro. Deveria ter feito um diário. Queria poder ler o que escrevi dez anos atrás. Queria poder saber como cheguei aqui. Agora o tom de azul mudou para lilás, isso quer dizer que mais um dia vai embora. Será que quando eu acordar amanhã terei dez anos a mais?
Se você acha que esse texto está estranho, tente recordar sua vida. Quando os clarões de tempo aparecerem você verá que o tempo também passou. Ontem você também via o céu mudando de azul para lilás.
Quando pensei o quanto minha vida mudou em um dia foi que vi o tempo que durou. Hoje já não me espanto tanto com o outro. Deveria ter feito um diário. Queria poder ler o que escrevi dez anos atrás. Queria poder saber como cheguei aqui. Agora o tom de azul mudou para lilás, isso quer dizer que mais um dia vai embora. Será que quando eu acordar amanhã terei dez anos a mais?
Se você acha que esse texto está estranho, tente recordar sua vida. Quando os clarões de tempo aparecerem você verá que o tempo também passou. Ontem você também via o céu mudando de azul para lilás.
sexta-feira, 6 de maio de 2011
Quando eu ficar velho.
Sentado no banco do calçadão, de costas para o movimento das pessoas que passam a correr, andar, pedalar e conversar, eu penso na vida que tive. Por volta das cinco e meia da tarde, hora que o sol cansa, dá a última espreguiçada e se recolhe para o sono devido aos trabalhadores. Afinal, de todos ele é o mais responsável. Falta apenas quando a gripe causada pela chuva o apanha. Mas o sol da minha cidade falta pouco ao trabalho. O inferno deve ter uma brisa mais amena. Eu sempre achei engraçado o cuidado que as pessoas têm com o corpo e a saúde. O fim é sempre o mesmo. Mas eu adaptei o ditado a algo que se assemelha mais ao meu vocabulário chulo, “da merda à merda”.
Não conseguir escrever um texto com início, meio e fim deixa qualquer cidadão puto. Todo mundo morreu, tenho oitenta e cinco anos. Minha mulher era estéril, não tive filhos. Cachorro, gato, peixe chupa-pedra, ou qualquer desses substitutos não geram nenhum afeto em mim. Então eu prefiro ficar só. O pior é que fiz uma cirurgia uns anos atrás que prejudicou o funcionamento da minha bexiga, mijo a cada 30 minutos. Como podem imaginar, minha autonomia é uma piada. Não posso ver um filme inteiro no cinema. Já perdi uma cartela premiada no bingo. Tudo porque mijo tanto quanto um bebê.
Nem pense que acho ruim ser velho assim. Na verdade acho revigorante. Xingo sem parar no meio da rua. Coço o saco, arroto, peido e tusso sem piedade. “Pobrezinho, já está senil”. Todo merdinha que fura uma fila ouve um “filho da puta” em troca do lugar roubado. Volto para casa com a metralhadora de obscenidades tinindo. A pior parte é não ter para quem contar os desaforos que falei. Não poder contar como é ruim urinar a cada trinta minutos. Não poder contar a tristeza que é falar apenas essas porcarias. Não ter com quem compartilhar os últimos “vá para a puta que o pariu” da minha vida.
Não conseguir escrever um texto com início, meio e fim deixa qualquer cidadão puto. Todo mundo morreu, tenho oitenta e cinco anos. Minha mulher era estéril, não tive filhos. Cachorro, gato, peixe chupa-pedra, ou qualquer desses substitutos não geram nenhum afeto em mim. Então eu prefiro ficar só. O pior é que fiz uma cirurgia uns anos atrás que prejudicou o funcionamento da minha bexiga, mijo a cada 30 minutos. Como podem imaginar, minha autonomia é uma piada. Não posso ver um filme inteiro no cinema. Já perdi uma cartela premiada no bingo. Tudo porque mijo tanto quanto um bebê.
Nem pense que acho ruim ser velho assim. Na verdade acho revigorante. Xingo sem parar no meio da rua. Coço o saco, arroto, peido e tusso sem piedade. “Pobrezinho, já está senil”. Todo merdinha que fura uma fila ouve um “filho da puta” em troca do lugar roubado. Volto para casa com a metralhadora de obscenidades tinindo. A pior parte é não ter para quem contar os desaforos que falei. Não poder contar como é ruim urinar a cada trinta minutos. Não poder contar a tristeza que é falar apenas essas porcarias. Não ter com quem compartilhar os últimos “vá para a puta que o pariu” da minha vida.
segunda-feira, 2 de maio de 2011
Seis.
Em um dia ele viu. Em dois minutos se apaixonou. Em dois dias beijou. Em um mês namorou. E hoje, completam-se seis meses. Seis meses que ele acorda mais feliz. Seis meses que ele dorme com a cabeça mais leve. Seis meses que passaram muito rápido. Eu disse que estava lá, e que sabia que voltaria a escrever sobre eles novamente. Cumpro minha promessa lançando outra. A de voltar para atualizar-lhes de como eles vão indo.
Só um último comentário. Lembram-se de quando eu escrevi sobre as pernas bambas dele? Pois é, continuam assim.
Só um último comentário. Lembram-se de quando eu escrevi sobre as pernas bambas dele? Pois é, continuam assim.
quinta-feira, 14 de abril de 2011
domingo, 10 de abril de 2011
O Ferrolho.
Parado de frente para a porta por duas horas. Fronte pressionando a madeira, a mão segurando a maçaneta. De olhos cerrados tenta tomar coragem para sair. Sair para vencer o medo. O problema é que não tem medo de algo específico. Não de ladrões, assassinos ou agressores. Não de almas, espíritos ou demônios. Sente o medo na concepção da existência.
Fruto da vida moderna, escondeu-se em casa. Não precisa sair para nada. Trabalha. Compra os suprimentos do mês pelo computador. Aprende uma nova língua. Tem amigos. Isolou-se por completo do contato humano direto. Morto e vivo pela modernidade. Desde os tempos do colégio achava que poderia muito bem viver só. Cumpriu seus planos quando teve uma ideia boa o suficiente para pagar suas contas sem ter que sair do computador. Escolheu o casulo. A hibernação social. Vive a utopia da caverna.
Só faz a barba quando começa a lhe esquentar o rosto. Corta os cabelos quando lhes incomodam a vista. Banha-se com muita regularidade porque não suporta o mal cheiro. Adquiriu manias. Alimenta as manias como a um bicho de estimação. Leu sobre sistemas elétricos e de encanamento para poder resolver os problemas habituais sozinho. Assim sua porta será aberta o minimo possível. Aceita os telefonemas com desgosto. Tenta falar o minimo possível. Já passou mais de um mês sem falar sequer letra que fosse.
Uma vez por ano, passa pelo constrangimento do cheiro da madeira, e do suor na maçaneta. Antes de finalmente conseguir abrir, precisa enxugar a mão esquerda na única calça jeans que tem. O primeiro passo é sempre o pior. O passo que lhe leva para o que acredita ser a real prisão. Desistiu de risos e conversas falsas. De olhares sem sentido e interesses esguios. De relações casuais sem profundidade. Pega um taxi com um gesto. Dá secamente as coordenadas. O taxi para em frente ao museu. Paga a corrida e desce sem desejar o falso boa tarde. Não dá a mínima se a tarde do taxista será boa ou não. Se o taxista morrer na próxima esquina não lhe fará a menor diferença.
Anda pelo corredor sem olhar para os lados. Chega ao banco que dá de frente ao “Philosopher in Meditation” de Rembrandt. Admira fixamente por trinta minutos. Se aproxima para ver o rosto abraçado pela luz mais de perto. Olha o ângulo da escada e vai embora. Volta para casa. Fecha a porta. Passa a chave. Tranca o ferrolho. E olha através do olho mágico. Ninguém o seguiu.
Fruto da vida moderna, escondeu-se em casa. Não precisa sair para nada. Trabalha. Compra os suprimentos do mês pelo computador. Aprende uma nova língua. Tem amigos. Isolou-se por completo do contato humano direto. Morto e vivo pela modernidade. Desde os tempos do colégio achava que poderia muito bem viver só. Cumpriu seus planos quando teve uma ideia boa o suficiente para pagar suas contas sem ter que sair do computador. Escolheu o casulo. A hibernação social. Vive a utopia da caverna.
Só faz a barba quando começa a lhe esquentar o rosto. Corta os cabelos quando lhes incomodam a vista. Banha-se com muita regularidade porque não suporta o mal cheiro. Adquiriu manias. Alimenta as manias como a um bicho de estimação. Leu sobre sistemas elétricos e de encanamento para poder resolver os problemas habituais sozinho. Assim sua porta será aberta o minimo possível. Aceita os telefonemas com desgosto. Tenta falar o minimo possível. Já passou mais de um mês sem falar sequer letra que fosse.
Uma vez por ano, passa pelo constrangimento do cheiro da madeira, e do suor na maçaneta. Antes de finalmente conseguir abrir, precisa enxugar a mão esquerda na única calça jeans que tem. O primeiro passo é sempre o pior. O passo que lhe leva para o que acredita ser a real prisão. Desistiu de risos e conversas falsas. De olhares sem sentido e interesses esguios. De relações casuais sem profundidade. Pega um taxi com um gesto. Dá secamente as coordenadas. O taxi para em frente ao museu. Paga a corrida e desce sem desejar o falso boa tarde. Não dá a mínima se a tarde do taxista será boa ou não. Se o taxista morrer na próxima esquina não lhe fará a menor diferença.
Anda pelo corredor sem olhar para os lados. Chega ao banco que dá de frente ao “Philosopher in Meditation” de Rembrandt. Admira fixamente por trinta minutos. Se aproxima para ver o rosto abraçado pela luz mais de perto. Olha o ângulo da escada e vai embora. Volta para casa. Fecha a porta. Passa a chave. Tranca o ferrolho. E olha através do olho mágico. Ninguém o seguiu.
sábado, 26 de março de 2011
5s.
A angústia de semanas passou. O pulso triplicou em força e velocidade. A pupila dilatou. Um turbilhão frio passou em seu estômago. Suas mãos suaram. Todos os poros estavam abertos. Sua respiração parou. Seu coração ameaçou sair do peito quebrando, rasgando, dilacerando tudo que via pela frente. Suas pernas tremeram. Todas as respostas possíveis passaram em sua cabeça nos segundos que pareceram horas. Tudo, pela resposta que ele mais quis ouvir. Nunca em sua vida, esperara e temera tanto por uma resposta.
Todos sintomas passaram para a boca. Um sorriso sem dentes, ainda nervoso, pela adrenalina de meses, descarregada em cinco segundos. Ela disse sim. Nada naquela hora o faria triste. Nada hoje o faria mais feliz. Nada vai ser como aqueles 5 segundos. Nada.
Todos sintomas passaram para a boca. Um sorriso sem dentes, ainda nervoso, pela adrenalina de meses, descarregada em cinco segundos. Ela disse sim. Nada naquela hora o faria triste. Nada hoje o faria mais feliz. Nada vai ser como aqueles 5 segundos. Nada.
sábado, 26 de fevereiro de 2011
Bifurcação.
A injustiça das escolhas permeiam minha cabeça agora. Poucas vezes tem-se a possibilidade da segunda chance. Eu sempre entendi aquela estória do mesmo homem e mesmo rio, portanto esqueça o seu argumento. Ele não me serve. Sinto-me inútil. No pior sentido da palavra. Sinto-me um boxeador ao chão. Um gato na boca de um cão. Napoleão em Santa Helena.
Logo eu. Eu que sempre fui o umbigo do mundo. Eu que sempre ditei a gravidade ao meu redor.
Logo eu. Eu que sempre fui o umbigo do mundo. Eu que sempre ditei a gravidade ao meu redor.
Bifurcação.
A injustiça das escolhas permeiam minha cabeça agora. Poucas vezes tem-se a possibilidade da segunda chance. Eu sempre entendi aquela estória do mesmo homem e mesmo rio, portanto esqueça o seu argumento. Ele não me serve. Sinto-me inútil. No pior sentido da palavra. Sinto-me um boxeador ao chão. Um gato na boca de um cão. Napoleão em Santa Helena.
Logo eu. Eu que sempre fui o umbigo do mundo. Eu que sempre ditei a gravidade ao meu redor.
Logo eu. Eu que sempre fui o umbigo do mundo. Eu que sempre ditei a gravidade ao meu redor.
quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011
O Velho.
Três da tarde. Esse é o horário que ele espera o dia inteiro. Toma um banho. Põe sua melhor roupa. Escolhe meticulosamente a gravata. Confere a combinação sapatos, meia, terno, camisa e gravata. Arruma o resto de cabelo que lhe resta. Escova os dentes no banheiro em forma de caixa de sapatos do quarto e sala que vive. Poderia morar em um apartamento melhor, caso mudasse para o subúrbio, mas prefere ficar perto da sua esquina.
Desce os dois andares de escada. Dá uma última lustrada nos sapatos usando a barra da calça. Brilham como um espelho. “Assim está melhor”. Compra o periódico, uma carteira de cigarros baratos, devolve as moedas ao bolso lateral da calça cinza. Enxuga o pingo de suor que ameaça escorrer pela fronte. Senta no banco de madeira já não tão branco. Olha as pessoas passarem. Confere as horas no relógio que fora de seu pai. Faltam 5 minutos.
Ao ver a condução número 338 se aproximar sente o coração palpitar. Ela desce. Jovem. Mas não jovem demais. Tem na expressão uma certa experiência, não condizente com sua pouca idade. Carrega livros. Vem ouvindo música e flutuando enquanto meche a boca no que ele imagina ser a letra que ouve nos pequenos plugues incrustados em suas orelhas. Ele ri com o canto da boca, abaixa um pouco o jornal, e através de seus óculos escuros fora de moda, vê quem quer para si. Gosta apenas de vê-la passar. Aqueles poucos segundos, 135 para ser mais exato, dão sentido à sua vida. Ela entra em casa.
Levanta, dobra minunciosamente o jornal. O conforta na articulação entre o tronco e o braço. Põe a mão no bolso e anda em direção ao Boteco mais próximo. Faz um sinal utilizando dois dedos ao garçom. Ele agora já entende e serve a dose de cachaça pedida empiricamente pelo “senhor que veste e usa terno nos olhos”. Pega as moedas depositadas previamente no bolso do conjunto e acalma-as ao balcão. Volta ao velho apartamento. Continua sua escrita. Descreve sem parar a moça. Procura novos adjetivos em uma velha gramática, também herança de seu pai. O último usado foi “cintilante”. Bebe mais, até o ponto que a embriaguez fecha seus olhos.
Repete o ritual gravata, cigarro e jornal. Olha para o relógio. Ela está atrasada. Espera por uma hora. Ela não vem. Volta para casa sem parar no bar. Abre uma nova garrafa de Cachaça. Procura adjetivos para saudade.
Desce os dois andares de escada. Dá uma última lustrada nos sapatos usando a barra da calça. Brilham como um espelho. “Assim está melhor”. Compra o periódico, uma carteira de cigarros baratos, devolve as moedas ao bolso lateral da calça cinza. Enxuga o pingo de suor que ameaça escorrer pela fronte. Senta no banco de madeira já não tão branco. Olha as pessoas passarem. Confere as horas no relógio que fora de seu pai. Faltam 5 minutos.
Ao ver a condução número 338 se aproximar sente o coração palpitar. Ela desce. Jovem. Mas não jovem demais. Tem na expressão uma certa experiência, não condizente com sua pouca idade. Carrega livros. Vem ouvindo música e flutuando enquanto meche a boca no que ele imagina ser a letra que ouve nos pequenos plugues incrustados em suas orelhas. Ele ri com o canto da boca, abaixa um pouco o jornal, e através de seus óculos escuros fora de moda, vê quem quer para si. Gosta apenas de vê-la passar. Aqueles poucos segundos, 135 para ser mais exato, dão sentido à sua vida. Ela entra em casa.
Levanta, dobra minunciosamente o jornal. O conforta na articulação entre o tronco e o braço. Põe a mão no bolso e anda em direção ao Boteco mais próximo. Faz um sinal utilizando dois dedos ao garçom. Ele agora já entende e serve a dose de cachaça pedida empiricamente pelo “senhor que veste e usa terno nos olhos”. Pega as moedas depositadas previamente no bolso do conjunto e acalma-as ao balcão. Volta ao velho apartamento. Continua sua escrita. Descreve sem parar a moça. Procura novos adjetivos em uma velha gramática, também herança de seu pai. O último usado foi “cintilante”. Bebe mais, até o ponto que a embriaguez fecha seus olhos.
Repete o ritual gravata, cigarro e jornal. Olha para o relógio. Ela está atrasada. Espera por uma hora. Ela não vem. Volta para casa sem parar no bar. Abre uma nova garrafa de Cachaça. Procura adjetivos para saudade.
terça-feira, 8 de fevereiro de 2011
"La Ritournelle"
“I've seen that road before
It always leads me here
Lead me to you door”
As influências da minha vida me trouxeram aqui. À esse texto que escrevo. Talvez se não ouvisse tanto. Ou assistisse tanto. Ou conversasse menos. Quem seria? As vezes que ouvi “The long and Winding Road” me fizeram ser mais melancólico? As vezes que ouvi Sonic Youth me fizeram mais inquieto? Ou eu simplesmente as encontrei por já ser melancólico e inquieto? As vezes parece-me que eu fui o encontrado. Elas que vieram a mim, por obra da vida.
Andar por uma rua, com a solidão de braços dados. Um cachecol que mais lembrava uma forca. A fumaça que era metade causada pelos cigarros e pelo frio. A desolação causada pela ausência de alguns que sempre imaginava comigo. Talvez só agora eu consiga desencadear os pensamentos logicamente. Consiga ver o que foi feito de mim. Sentir os pingos gelados de uma chuva fina atacarem meu rosto enquanto ouvia “It's Always a Relief”. Sair do escuro. “Has left a pool of tears”.
Voltar para onde meu coração aquece. Voltar para a vida que eu abandonei. Voltar a sorrir com todos os dentes. Voltar ao inesperado. Voltar ao decadente. Voltar ao espontâneo. Conhecê-la. Conhecer o improvável. Amar o improvável. Sair do (transitório). Andar por onde eu conheço. Onde posso sair e encontrar o que já conheço. Onde meu sangue se sente parte do ar. Aqui eu sou feliz.
Rejeito, pelo menos por agora, a possibilidade de sair. De voltar. De sentir a forca. “It always leads me here. Lead me to your door.”. Você me deu mais um motivo pra não sair. Além dos que eu já tinha. Você me deu mais um motivo para esfriar meu sangue caso abandone-a.
*O texto inteiro foi escrito por "The Long and Winding Road" e pela influência que ela tem em mim.
It always leads me here
Lead me to you door”
As influências da minha vida me trouxeram aqui. À esse texto que escrevo. Talvez se não ouvisse tanto. Ou assistisse tanto. Ou conversasse menos. Quem seria? As vezes que ouvi “The long and Winding Road” me fizeram ser mais melancólico? As vezes que ouvi Sonic Youth me fizeram mais inquieto? Ou eu simplesmente as encontrei por já ser melancólico e inquieto? As vezes parece-me que eu fui o encontrado. Elas que vieram a mim, por obra da vida.
Andar por uma rua, com a solidão de braços dados. Um cachecol que mais lembrava uma forca. A fumaça que era metade causada pelos cigarros e pelo frio. A desolação causada pela ausência de alguns que sempre imaginava comigo. Talvez só agora eu consiga desencadear os pensamentos logicamente. Consiga ver o que foi feito de mim. Sentir os pingos gelados de uma chuva fina atacarem meu rosto enquanto ouvia “It's Always a Relief”. Sair do escuro. “Has left a pool of tears”.
Voltar para onde meu coração aquece. Voltar para a vida que eu abandonei. Voltar a sorrir com todos os dentes. Voltar ao inesperado. Voltar ao decadente. Voltar ao espontâneo. Conhecê-la. Conhecer o improvável. Amar o improvável. Sair do (transitório). Andar por onde eu conheço. Onde posso sair e encontrar o que já conheço. Onde meu sangue se sente parte do ar. Aqui eu sou feliz.
Rejeito, pelo menos por agora, a possibilidade de sair. De voltar. De sentir a forca. “It always leads me here. Lead me to your door.”. Você me deu mais um motivo pra não sair. Além dos que eu já tinha. Você me deu mais um motivo para esfriar meu sangue caso abandone-a.
*O texto inteiro foi escrito por "The Long and Winding Road" e pela influência que ela tem em mim.
Isso, é verdade.
Eu que sempre fui um bom mentiroso. Mas não encare da forma errada. Nunca menti por mal. Sempre o fiz por ser a melhor solução. Evitar conflitos supostamente desnecessários. Eu nunca expurguei a mentira do meu repertório de verdades. Eu não sou desonesto. Posso ser medroso, desonesto não. Nunca menti sobre nada de relevância humana. Só as vezes não estava tudo tão bem quanto eu dizia. Digo isso a quase todos vocês. Amigos, família, que são quase um só. Mas não a você. Você não conhece esse meu lado. Com você eu sou cru. Com você, minha pele se torna invisível. Se você quiser ver, pode ver tudo que tem dentro. Entranhas, ar, tudo.
Minhas mentiras ficaram longe de você. Você está pegando um eu mais difícil. Mas verdadeiro em tudo que se possa imaginar. Desde o primeiro dia.
Minhas mentiras ficaram longe de você. Você está pegando um eu mais difícil. Mas verdadeiro em tudo que se possa imaginar. Desde o primeiro dia.
Nota.
A vida me preenche de improbabilidades.
(As opiniões expressas nesse blog definem estritamente TODAS as do autor)
(As opiniões expressas nesse blog definem estritamente TODAS as do autor)
quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011
O homem sem nome.
Depois da cirurgia de correção do septo nasal, esperava acordar na sala de recuperação. Ao invés disso, acordou em um quarto cinzento deitado em uma cama pequena com o colchão tão fino que dava para sentir as ripas de madeira que davam sustentação a armação de metal tubular da cama. O simples movimento de levantar fez a cama exprimir um barulho tão alto quanto irritante. Viu uma porta, ao abri-la encontrou uma despensa abarrotada de latas de feijão, um abridor e uma colher. No outro canto do quarto um vaso sanitário amarelado e sujo, uma pia minuscula e uma saída de encaixe para um chuveiro. O chuveiro mesmo não existia. Era isso. Exceto por um pequeno buraco na parede.
A iluminação do quarto inteiro dependia do buraco. Esse buraco dava para um apartamento vizinho. Normal. Padrão para a época. Tentou gritar por socorro, mas nada aconteceu. Era como se o homem que bebia uma cerveja assistindo algo na televisão simplesmente não ouvisse. Nem a mulher que aparecia de tempos em tempos trazendo as louças que seriam postas para o jantar. Gritou até ficar rouco. Pelo tamanho da barba calculou ter dormido por três dias.
O desespero deu lugar ao conformismo no terceiro mês. A barba já cobrira todo o seu rosto. Cortava as unhas com os dentes. Sentia gosto de pedra ao comer o feijão. Parou de falar para não contaminar a lembrança que tinha do tom de voz das pessoas que mais gostava, porém o tempo fez eles se tornarem mais confusos. Parou de procurar explicações do porque estar preso de uma forma tão cruel, até os assassinos têm com quem conversar. Não lembra de ter feito mal a ninguém. Pelo menos não que valha tamanha punição. Satisfazia sua curiosidade sobre o mundo vendo os vizinhos de buraco. Sabia que era hora de dormir quando parava o movimento na sala através do buraco. Queria ler alguma coisa, ouvir uma música. Queria sentir um toque. Sonhava todas as noites com um toque. Algumas vezes com um simples encontrão enquanto esperava o metrô.
Um dia perguntaram-lhe seu nome através do buraco. Respondeu. Isso se repetia no que ele achava ser uma vez por ano. Contou trinta e sete indagações iguais. Na trigésima oitava não soube responder, já não sabia seu nome. Não conseguia lembrar como falá-lo. Talvez pela solidão, ou talvez pelo mal de Alzheimer. A idade havia chegado. Perdeu todas as lembranças. Acordava diariamente sem saber onde estava. As latas de feijão continuavam a aparecer. Se perguntava sempre se ainda estava vivo. Desejava a morte como se deseja uma mulher. Esqueceu como rir. E como chorar também. Transformou-se em um fantasma vivo. Era assim que se sentia. Sentiu que passou e não foi visto. Sentiu-se um mendigo, um marginal. Um daqueles que não se vê enquanto andamos na rua.
Acordou um dia com uma arma ao seu lado. Apenas uma bala no tambor. Pensou por dois dias e disparou contra a parede. Agora poderia ver o outro lado com os dois olhos. Notou que os buracos eram semelhantes. Iguais se vistos de longe. Alguém fez o primeiro buraco assim como ele. Alguém, assim como ele, teve mais medo do que não conhece do que entusiasmo com a chance de sair da situação mais deplorável do mundo e preferiu apenas um pouco mais de luz, e de vida alheia.
A iluminação do quarto inteiro dependia do buraco. Esse buraco dava para um apartamento vizinho. Normal. Padrão para a época. Tentou gritar por socorro, mas nada aconteceu. Era como se o homem que bebia uma cerveja assistindo algo na televisão simplesmente não ouvisse. Nem a mulher que aparecia de tempos em tempos trazendo as louças que seriam postas para o jantar. Gritou até ficar rouco. Pelo tamanho da barba calculou ter dormido por três dias.
O desespero deu lugar ao conformismo no terceiro mês. A barba já cobrira todo o seu rosto. Cortava as unhas com os dentes. Sentia gosto de pedra ao comer o feijão. Parou de falar para não contaminar a lembrança que tinha do tom de voz das pessoas que mais gostava, porém o tempo fez eles se tornarem mais confusos. Parou de procurar explicações do porque estar preso de uma forma tão cruel, até os assassinos têm com quem conversar. Não lembra de ter feito mal a ninguém. Pelo menos não que valha tamanha punição. Satisfazia sua curiosidade sobre o mundo vendo os vizinhos de buraco. Sabia que era hora de dormir quando parava o movimento na sala através do buraco. Queria ler alguma coisa, ouvir uma música. Queria sentir um toque. Sonhava todas as noites com um toque. Algumas vezes com um simples encontrão enquanto esperava o metrô.
Um dia perguntaram-lhe seu nome através do buraco. Respondeu. Isso se repetia no que ele achava ser uma vez por ano. Contou trinta e sete indagações iguais. Na trigésima oitava não soube responder, já não sabia seu nome. Não conseguia lembrar como falá-lo. Talvez pela solidão, ou talvez pelo mal de Alzheimer. A idade havia chegado. Perdeu todas as lembranças. Acordava diariamente sem saber onde estava. As latas de feijão continuavam a aparecer. Se perguntava sempre se ainda estava vivo. Desejava a morte como se deseja uma mulher. Esqueceu como rir. E como chorar também. Transformou-se em um fantasma vivo. Era assim que se sentia. Sentiu que passou e não foi visto. Sentiu-se um mendigo, um marginal. Um daqueles que não se vê enquanto andamos na rua.
Acordou um dia com uma arma ao seu lado. Apenas uma bala no tambor. Pensou por dois dias e disparou contra a parede. Agora poderia ver o outro lado com os dois olhos. Notou que os buracos eram semelhantes. Iguais se vistos de longe. Alguém fez o primeiro buraco assim como ele. Alguém, assim como ele, teve mais medo do que não conhece do que entusiasmo com a chance de sair da situação mais deplorável do mundo e preferiu apenas um pouco mais de luz, e de vida alheia.
segunda-feira, 17 de janeiro de 2011
Wilson 2.
As últimas lembranças foram da água entrando pelo vidro estraçalhado, o cheiro de lixo que à acompanhava, e uma raiva por não ter desmaiado. Afinal, para que usar cinto de segurança num suicídio? Foi isso que Wilson se recordou quando acordou em um lugar estranho.
Por um instante tentou identificar se estava vivo ou morto. Lembrou-se que foi cético por toda a vida. Então, supôs estar vivo. Desnecessário o adendo da surpresa ao descobrir que não estava. Como é sabido, Wilson odeia surpresas. Descobriu que não estava vivo quando respirou e não sentiu o incômodo característico de seus pulmões carregados do câncer. E quando não sentiu ar sair ao expirar. Sem contusões. Impossível após uma queda de vinte metros dentro de um carro. Decidiu avaliar o lugar que se encontrava. Uma sala de espera vazia, nos padrões da antessala dos dentistas, só que vazia. Pitoresco é o mínimo que se possa dizer. A entrada do senhor negro passou desapercebida. Wilson ainda examinava o lugar que estava, e ainda checava sua pulsação para tentar sentir que ainda estava vivo. Mesmo assustado, seguiu o homem que com o braço esticado designava-lhe o caminho a seguir.
Um corredor enorme, cujo fim era imperceptível estava à sua frente. Wilson aproveitou o caminho para pensar sobre o que tinha acontecido, e praguejou algumas vezes sobre estar errado. O corredor chegou ao fim junto a uma porta branca sem maçanetas, justamente quando Wilson chegara à uma conclusão. Mas que tinha decidido esperar para falar com alguém que se mostrasse competente sobre seu caso.
Ao adentrar, Wilson viu um homem, também negro, em pé, no centro da sala. Ao ser perguntado pelo homem sobre o motivo que havia tomado tal atitude Wilson foi enfático, “porque quis”. Pensou ser melhor dá-lhe a verdade do que passar quinze segundos pensando sobre uma resposta certa que talvez fosse a errada. O homem sem feição não esboçou reação sobre a declaração de Wilson. Wilson estava perdendo a paciência.
Por um instante tentou identificar se estava vivo ou morto. Lembrou-se que foi cético por toda a vida. Então, supôs estar vivo. Desnecessário o adendo da surpresa ao descobrir que não estava. Como é sabido, Wilson odeia surpresas. Descobriu que não estava vivo quando respirou e não sentiu o incômodo característico de seus pulmões carregados do câncer. E quando não sentiu ar sair ao expirar. Sem contusões. Impossível após uma queda de vinte metros dentro de um carro. Decidiu avaliar o lugar que se encontrava. Uma sala de espera vazia, nos padrões da antessala dos dentistas, só que vazia. Pitoresco é o mínimo que se possa dizer. A entrada do senhor negro passou desapercebida. Wilson ainda examinava o lugar que estava, e ainda checava sua pulsação para tentar sentir que ainda estava vivo. Mesmo assustado, seguiu o homem que com o braço esticado designava-lhe o caminho a seguir.
Um corredor enorme, cujo fim era imperceptível estava à sua frente. Wilson aproveitou o caminho para pensar sobre o que tinha acontecido, e praguejou algumas vezes sobre estar errado. O corredor chegou ao fim junto a uma porta branca sem maçanetas, justamente quando Wilson chegara à uma conclusão. Mas que tinha decidido esperar para falar com alguém que se mostrasse competente sobre seu caso.
Ao adentrar, Wilson viu um homem, também negro, em pé, no centro da sala. Ao ser perguntado pelo homem sobre o motivo que havia tomado tal atitude Wilson foi enfático, “porque quis”. Pensou ser melhor dá-lhe a verdade do que passar quinze segundos pensando sobre uma resposta certa que talvez fosse a errada. O homem sem feição não esboçou reação sobre a declaração de Wilson. Wilson estava perdendo a paciência.
quarta-feira, 5 de janeiro de 2011
Textos sobre os outros sempre são mais fáceis.
Carlos ama Maria. Ama como se a conhecesse a anos, sentiu uma empatia instantânea. Talvez por achar que são parecidos. Talvez por achar ter encontrado a parceira ideal para a sua causticidade. Maria parece não se espantar com o jeito de Carlos. E Carlos amou o jeito de Maria desde o primeiro segundo. Quando a conheceu, não parou de olhá-la. Não conseguia. Apelou para o álcool para tentar mudar o seu foco de atenção. Não conseguiu, mas pelo menos achou ter disfarçado.
Carlos não sabe até hoje como teve a coragem para pedir à Maria o que já queria desde o primeiro dia. E sabe menos ainda como Maria aceitou o seu pedido. Carlos estava ansioso. Sentia uma comichão inexplicável no tórax. Sente como se algo estivesse vivo e se mexendo por dentro. Algo que quer sair, todas as vezes que a encontra. Basta vê-la.
Mesmo sem conhecer Carlos, conto essa história. Eu estava presente. Mesmo não tendo sido notado, talvez essa história seja assim. Talvez, como pensa Maria, as coisas sejam feitas para acabar. Mas ví os olhos de Carlos ao esperar Maria entrar no carro. Ví os olhos de Carlos inertes mirando apenas um ponto. Senti as pernas de Carlos balançarem quando pediu um beijo. Sei do que ele sente sempre que a vê. Sei o que ele pediu quando viu três estrelas cadentes na mesma noite de ano novo apesar de ser incrédulo. E, principalmente. Sei que essa não vai ser a última vez que escreverei sobre essa história.
Carlos não sabe até hoje como teve a coragem para pedir à Maria o que já queria desde o primeiro dia. E sabe menos ainda como Maria aceitou o seu pedido. Carlos estava ansioso. Sentia uma comichão inexplicável no tórax. Sente como se algo estivesse vivo e se mexendo por dentro. Algo que quer sair, todas as vezes que a encontra. Basta vê-la.
Mesmo sem conhecer Carlos, conto essa história. Eu estava presente. Mesmo não tendo sido notado, talvez essa história seja assim. Talvez, como pensa Maria, as coisas sejam feitas para acabar. Mas ví os olhos de Carlos ao esperar Maria entrar no carro. Ví os olhos de Carlos inertes mirando apenas um ponto. Senti as pernas de Carlos balançarem quando pediu um beijo. Sei do que ele sente sempre que a vê. Sei o que ele pediu quando viu três estrelas cadentes na mesma noite de ano novo apesar de ser incrédulo. E, principalmente. Sei que essa não vai ser a última vez que escreverei sobre essa história.
E.A.P
“A sua réplica, que era perfeita imitação de mim mesmo, consistia em palavras e gestos, e desempenhava admiravelmente o seu papel. A minha roupa era coisa fácil de copiar; o meu andar e maneiras gerais foram, sem dificuldade, assimilados e, a despeito de seu defeito constitucional, até mesmo a minha voz não lhe escapava. Naturalmente, não alcançava ele os meus tons mais elevados, mas o timbre era idêntico e o seu sussurro característico tornou-se o verdadeiro eco do meu.”
Trecho do conto "William Wilson" de Edgar Allan Poe.
Trecho do conto "William Wilson" de Edgar Allan Poe.
segunda-feira, 3 de janeiro de 2011
Um adendo.
Esse blog é protegido por uma licença Creative Commons, preserva apenas alguns direitos. Mas, se alguém, a qualquer hora, quiser mandar um "Ctrl+C" pode ir com força. É só dizer de onde tirou.
Deixo aqui um texto, junto com o link para quem quiser saber mais sobre o que eu estou falando:
"Lawrence Lessig responde a ASCAP e desafia o presidente da organização para um debate
Ataque da ASCAP ao Creative em Commons
Por Lawrence Lessig*
Publicado no Huffington Post
A Sociedade Americana de Compositores, Autores e Editores (ASCAP, na sigla em ingês) lançou uma campanha para levantar fundos de seus membros para contratar lobistas para protegê-los contra os perigos do “Copyleft”. Grupos como o Creative Commons, Public Knowledge e Eletronic Frontier Foundation (EFF) estão se “mobilizando”, segundo descreve a ASCAP em carta a seus membros, “para promover o ‘Copyleft’ a fim de minar o nosso ‘Copyright’”. “Nossos oponentes estão influenciando o Congresso contra os interesses dos criadores de música”, alerta a ASCAP. Aliás, como a carta ameaçadoramente prevê, essa é o “maior desafio já enfrentado” pela ASCAP. (Historiadores da BMI podem ficar um pouco surpresos a respeito deste pedido em particular).
Como membro do conselho fundador de duas dessas três organizações e ex-membro do conselho do terceiro, acho que deveria estar orgulhoso pelo fato de uma instituição de 96 anos estar tão aterrorizada com o nosso trabalho. E eu estaria – se qualquer um desses motivos para angariação de fundos fosse verdadeiro.
Mas não são. Creative Commons, Public Knowledge e EFF não têm como objetivo minar o Copyright [Direitos Autorais]; tais organizações não estão espalhando que “a música deve ser gratuita”; e definitivamente não há ainda nenhum grupo no Congresso a favor de nenhuma das questões que essas instituições impulsionam.
Eu conheço melhor o Creative Commons, então me deixe responder às acusações da ASCAP.
O Creative Commons é uma organização sem fins lucrativos que oferece licenças de direitos autorais gratuitamente a artistas e criadores de modo que eles possam disponibilizar suas obras com a liberdade que desejarem (Pense em “Alguns direitos reservados” em vez de “Todos os direitos reservados”). Usando essas licenças, o músico pode permitir que sua música seja usada para fins não-comerciais (por exemplo, por crianças que querem fazer um vídeo ou para compartilhamento entre amigos), desde que a sua criação seja atribuída ao autor. Ou uma acadêmica pode permitir que seu trabalho seja compartilhado por qualquer motivo, desde que também respeitada a exigência de atribuição da autoria. Ou um projeto colaborativo como uma wiki pode garantir que a obra coletiva das milhões de pessoas que a construíram seja mantido livre para todos eternamente. Centenas de milhões de objetos digitais – desde músicas, vídeos e fotografias a projetos arquitetônicos , revistas científicas, planos de aulas, livros e blogs – foram licenciados desta maneira por uma extraordinária variedade de criadores ou titulares de direitos, incluindo Nine Inch Nails, Beastie Boys, Youssou N’Dour, Curt Smith, David Byrne, Radiohead, Jonathan Coulton, Kristin Hersh e Snoop Dogg, assim como a Wikipedia e a Casa Branca.
Essas licenças são, obviamente, licenças de direitos autorais. Elas dependem de um sistema forte e confiável de direitos autorais para que funcionem. Logo o CC não poderia estar interessado em “minar” este mesmo sistema do qual dependem essas licenças – os direitos autorais. Pelo contrário, aliás, o CC visa apenas fortalecer os objetivos dos direitos autorais ao conferir aos criadores um caminho mais simples para exercerem os seus direitos.
Essas licenças são, o que também é óbvio, voluntárias. O CC nunca afirmou que alguém deveria renunciar aos seus direitos.
These licenses are also (and also obviously) voluntary. CC has never argued that anyone should waive any of their rights. (Eu fui menos tolerante na academia, mas nunca afirmei que qualque artista é moralmente obrigado a renunciar a qualquer direito obtido em função de sua obra).
E, finalmente, essas licenças não revelam qualquer objetivo de tornar a “música gratuita”. O Nine Inch Nails, por exemplo, teve recorde de vendas com músicas licenciadas em Creative Commons.
Em vez disso, a única coisa que o Creative Commnons quer tornar livre são os artistas – livres para escolher a melhor maneira de licenciar sua obra criativa. Esse é um valor no qual nós realmente acreditamos; o direito autoral foi pensado para os autores e estes autores deveriam ter controle sobre seu direito autoral.
Essa não foi a primeira vez que a ASCAP interpretou de forma errada os objetivos da nossa organização. Mas seria possível tornar esta a última vez? Não temos objeções a organizações que recolhem direitos autorais: elas também foram uma solução inovadora e voluntária (ao menos na América) para um problema desafiador de direito autoral criado pelas novas tecnologias. Eu, pelo menos, estou confiante de que as sociedades arrecadadoras de direitos serão para sempre parte do cenário do direito autoral.
Então eis o meu desafio, presidente da ASCAP Paul Williams: vamos resolver as nossas diferenças como as almas decentes fazem, através de um debate. Sou um grande fã seu, e se me der permissão, eu pretendo cantar uma de suas canções (ou não) se você aceitar meu desafio de fazer um debate. Poderíamos pedir à Livraria Pública de Nova Iorque para sediar o evento. Eu pretendo fazer o possível para me adequar a sua agenda. Vamos encarar e resolver essas diferenças com honestidade e boa fé. Não há duvidas de que temos discordâncias (por exemplo, eu adoro dias chuvosos e segundas-feiras raramente me deixam deprimido – “I love rainy days, and Mondays rarely get me down”). Mas com relação às questões que importam às nossas organizações, nenhuma diferença deveria ensejar um ataque.
Enquanto isso, você pode ler mais sobre o Creative Commons aqui, e apoiar a reação à campanha da ASCAP aqui.
*Lawrence Lessig é Professor da Escola de Direito de Harvard e diretor do Safra Center for Ethics."
http://www.culturalivre.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=374&Itemid=40
Deixo aqui um texto, junto com o link para quem quiser saber mais sobre o que eu estou falando:
"Lawrence Lessig responde a ASCAP e desafia o presidente da organização para um debate
Ataque da ASCAP ao Creative em Commons
Por Lawrence Lessig*
Publicado no Huffington Post
A Sociedade Americana de Compositores, Autores e Editores (ASCAP, na sigla em ingês) lançou uma campanha para levantar fundos de seus membros para contratar lobistas para protegê-los contra os perigos do “Copyleft”. Grupos como o Creative Commons, Public Knowledge e Eletronic Frontier Foundation (EFF) estão se “mobilizando”, segundo descreve a ASCAP em carta a seus membros, “para promover o ‘Copyleft’ a fim de minar o nosso ‘Copyright’”. “Nossos oponentes estão influenciando o Congresso contra os interesses dos criadores de música”, alerta a ASCAP. Aliás, como a carta ameaçadoramente prevê, essa é o “maior desafio já enfrentado” pela ASCAP. (Historiadores da BMI podem ficar um pouco surpresos a respeito deste pedido em particular).
Como membro do conselho fundador de duas dessas três organizações e ex-membro do conselho do terceiro, acho que deveria estar orgulhoso pelo fato de uma instituição de 96 anos estar tão aterrorizada com o nosso trabalho. E eu estaria – se qualquer um desses motivos para angariação de fundos fosse verdadeiro.
Mas não são. Creative Commons, Public Knowledge e EFF não têm como objetivo minar o Copyright [Direitos Autorais]; tais organizações não estão espalhando que “a música deve ser gratuita”; e definitivamente não há ainda nenhum grupo no Congresso a favor de nenhuma das questões que essas instituições impulsionam.
Eu conheço melhor o Creative Commons, então me deixe responder às acusações da ASCAP.
O Creative Commons é uma organização sem fins lucrativos que oferece licenças de direitos autorais gratuitamente a artistas e criadores de modo que eles possam disponibilizar suas obras com a liberdade que desejarem (Pense em “Alguns direitos reservados” em vez de “Todos os direitos reservados”). Usando essas licenças, o músico pode permitir que sua música seja usada para fins não-comerciais (por exemplo, por crianças que querem fazer um vídeo ou para compartilhamento entre amigos), desde que a sua criação seja atribuída ao autor. Ou uma acadêmica pode permitir que seu trabalho seja compartilhado por qualquer motivo, desde que também respeitada a exigência de atribuição da autoria. Ou um projeto colaborativo como uma wiki pode garantir que a obra coletiva das milhões de pessoas que a construíram seja mantido livre para todos eternamente. Centenas de milhões de objetos digitais – desde músicas, vídeos e fotografias a projetos arquitetônicos , revistas científicas, planos de aulas, livros e blogs – foram licenciados desta maneira por uma extraordinária variedade de criadores ou titulares de direitos, incluindo Nine Inch Nails, Beastie Boys, Youssou N’Dour, Curt Smith, David Byrne, Radiohead, Jonathan Coulton, Kristin Hersh e Snoop Dogg, assim como a Wikipedia e a Casa Branca.
Essas licenças são, obviamente, licenças de direitos autorais. Elas dependem de um sistema forte e confiável de direitos autorais para que funcionem. Logo o CC não poderia estar interessado em “minar” este mesmo sistema do qual dependem essas licenças – os direitos autorais. Pelo contrário, aliás, o CC visa apenas fortalecer os objetivos dos direitos autorais ao conferir aos criadores um caminho mais simples para exercerem os seus direitos.
Essas licenças são, o que também é óbvio, voluntárias. O CC nunca afirmou que alguém deveria renunciar aos seus direitos.
These licenses are also (and also obviously) voluntary. CC has never argued that anyone should waive any of their rights. (Eu fui menos tolerante na academia, mas nunca afirmei que qualque artista é moralmente obrigado a renunciar a qualquer direito obtido em função de sua obra).
E, finalmente, essas licenças não revelam qualquer objetivo de tornar a “música gratuita”. O Nine Inch Nails, por exemplo, teve recorde de vendas com músicas licenciadas em Creative Commons.
Em vez disso, a única coisa que o Creative Commnons quer tornar livre são os artistas – livres para escolher a melhor maneira de licenciar sua obra criativa. Esse é um valor no qual nós realmente acreditamos; o direito autoral foi pensado para os autores e estes autores deveriam ter controle sobre seu direito autoral.
Essa não foi a primeira vez que a ASCAP interpretou de forma errada os objetivos da nossa organização. Mas seria possível tornar esta a última vez? Não temos objeções a organizações que recolhem direitos autorais: elas também foram uma solução inovadora e voluntária (ao menos na América) para um problema desafiador de direito autoral criado pelas novas tecnologias. Eu, pelo menos, estou confiante de que as sociedades arrecadadoras de direitos serão para sempre parte do cenário do direito autoral.
Então eis o meu desafio, presidente da ASCAP Paul Williams: vamos resolver as nossas diferenças como as almas decentes fazem, através de um debate. Sou um grande fã seu, e se me der permissão, eu pretendo cantar uma de suas canções (ou não) se você aceitar meu desafio de fazer um debate. Poderíamos pedir à Livraria Pública de Nova Iorque para sediar o evento. Eu pretendo fazer o possível para me adequar a sua agenda. Vamos encarar e resolver essas diferenças com honestidade e boa fé. Não há duvidas de que temos discordâncias (por exemplo, eu adoro dias chuvosos e segundas-feiras raramente me deixam deprimido – “I love rainy days, and Mondays rarely get me down”). Mas com relação às questões que importam às nossas organizações, nenhuma diferença deveria ensejar um ataque.
Enquanto isso, você pode ler mais sobre o Creative Commons aqui, e apoiar a reação à campanha da ASCAP aqui.
*Lawrence Lessig é Professor da Escola de Direito de Harvard e diretor do Safra Center for Ethics."
http://www.culturalivre.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=374&Itemid=40
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