domingo, 24 de julho de 2011

O que não tive cabeça para pensar no Título.

Meu sangue engrossou. Coagulou dentro das veias e artérias. Está preto. Minhas veias até tentaram aumentar o calibre para ele passar. Em vão, ele quis ficar. A pasta em que se transformou espera as respostas serem enviadas pelo cérebro. As respostas das inúmeras perguntas que chacoalham como um carro baixo em uma rua esburacada precisam de um passeio estável para alinharem-se. As perguntas estão em frequências diferentes. Não pertencem à mesma escala musical.

Por hora espero o sono chegar para ver se durante o descanso consigo acalmar meu coração. Fazer ele voltar a bombear aos poucos. Mililitro por mililitro dos cinco mil que estancam o gás carbônico de ser expelido. Entenda, é por você que me desespero.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Aquele do cara que nunca dorme. Parte um ou única.

Completos os vinte primeiros anos de vida de forma discreta, sempre foi mediano. Aluno médio. Beleza média. Humor médio. Até o dia do acidente. Estava só no carro, bebeu uma cerveja a mais e encontrou a árvore na avenida principal do caminho para casa. Quem viu o acidente e o resgate garantia que ele nunca mais abriria os olhos. Se o fizesse, nunca recuperaria os sentidos normais. Impossível sair sem sequela alguma. As previsões estavam absolutamente corretas.

No quarto escuro do hospital com ela rezando ao lado da cama, abriu os olhos. Um alvoroço foi instaurado. Todos da equipe médica checaram uma por uma de suas funções. Sentia as pernas. Via com clareza. Ouvia e falava perfeitamente. Sentia o odor do Éter usado na esterilização do ambiente. Lembrava seu nome, lembrava que o dela começava com "L". Lembrava a soma entre dois números. O ano que o Brasil fora campeão da Copa do Mundo. Lembrava inclusive a escalação. Ainda não sabia, mas sua memória se tornaria um marco.

Um dia inteiro de exames e festas dos amigos e familiares. Todos o visitavam. Queriam ver o milagre acontecido. Todos impressionavam-se, além da cicatriz escondida pelo cabelo na parte lateral da cabeça, nada. Nada, mesmo. Nem um risco sequer para que alguém acredite que ele estava em um acidente tão bruto. Mais alguns exames. Todos horrivelmente normais. No ano de 1995 os carros não tinham tantos recursos de segurança. O dia passou numa velocidade estonteante. Talvez por ter acontecido tanta coisa. Chegou a noite. As horas simplesmente andavam. O sono não chegava. “Vou dar-lhe um pouco mais de anestésico.” disse o médico. Ineficaz como um guarda chuvas em dia que caem canivetes. Já passam das duas da manhã. “Deve ser a excitação” especula o de branco.

Aos quarenta e seis anos, (os vinte e seis já passaram, pela mesma preguiça que bateu no autor da bíblia), ele ainda não dormiu. Descobriram em um exame invasivo, que houve um dano irreversível no cérebro. No começo acharam que morreria de estafa física e mental. Simplesmente não aconteceu. As funções vitais mantinham-se intactas. Sem perda de memória. Sem alteração nas taxas hormonais. Um horror biológico. Aproveitou para fazer tudo. Graduou-se em nove cursos diferentes. Das mais diversas áreas do conhecimento. Trabalhava mais que todos. Possui um relógio biológico invejável, exceto pelo sono. Parou de beber e treinou bastante, o que lhe tornou um exímio motorista. Casou-se com ela, e sempre teve tempo para a família. Cuidava de tudo que podia. Viajou o quanto pode, afinal, seu corpo nunca cansava. Tinha um problema sério em sua vida. A evolução surreal da maturidade. Aos vinte e cinco pensava como se dez anos mais velho fosse. E assim sucessivamente em progressão geométrica.

O único desgaste que sentia era psíquico. Não suportava o tédio. Não havia mais filme que o entretece. Livro que o interessasse, ou música que nunca ouvira. Todos os tipos de trabalhos manuais era um perito. Marcenaria, fundição, luthieria. Era exímio músico em vários instrumentos. Nada o interessava. Apenas sua família. Viveu os últimos 5 anos em função deles. Sabe que não será imortal, os anos passaram em sua pele. Já não tem mais a rigidez cutânea que tinha. Os cabelos mudaram de cor. Apenas um hábito não mudou. Todos os dias, durante o banho matinal, passa o shampoo no cabelo, sente a cicatriz com a ponta dos dedos. E sonha acordado com conseguir dormir novamente. Sonha com o dia que um sonho volte a acontecer. Sonha em dormir, nem que seja na morte.

domingo, 29 de maio de 2011

A porta.

A porta automática abriu quando por sensores notou sua presença. Passou a portaria, entrou no elevador. Pediu pelo quarto andar ao ascensorista. Entrou na sua baia. Pousou o paletó no gancho ao lado da mesa em forma de “L”. Começou mais um dia de trabalho. Fez duas ligações. Notou que, mais uma vez, furtaram sua caneta. “Absurdo” pensou, “meu nome estava escrito nela”, completou. Checou o e-mail da empresa. Pouco mais de dez mensagens. Checou o de uso pessoal. Zero. Resolveu as pendências até o meio dia. Desceu para o almoço.

A porta automática abriu quando por sensores notou sua presença. Resolveu ir ao outro restaurante. Não àquele que vai diariamente, mas o mais caro. Olhou a carta e pediu lagosta. Comeu o suficiente, pediu café curto e conta. A porta automática abriu quando por sensores notou sua presença. Pediu o quarto andar. Checou novamente o e-mail pessoal. Zero. Checou o profissional. Dois. Resolveu o que faltava. Olhou quando ela passou. Olhou através da janela alguns metros à direita. Sua baia é central.

Telefonou de seu celular para o serviço de acompanhantes. Pediu a de sempre, mas com um extra. Que trouxessem-lhe um bolo. Pegou o metrô. Abriu a porta de casa, a geladeira e uma cerveja. Sentou-se junto da TV e assistiu ao noticiário, enquanto esperava sua “encomenda” e lembrou que no momento em que porta automática abriu quando por sensores notou sua presença pensou ter ouvido-a falar “feliz aniversário”

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Quando o céu deixa de ser azul.

Passei um tempo sentado junto ao batente da porta. Vi os tons em azul mudando. Um tempo que passou sem eu sentir. Ontem eu também estava sentado no mesmo lugar. Minha casa era basicamente a mesma. Minha vida completamente diferente. Nos dez anos que passaram de ontem para hoje perdi e ganhei tempo. Ontem tinha um outro cachorro deitado olhando para o portão. Hoje fumei enquanto esperava o tempo passar. Nem lembro mais sobre o que pensava tanto. Talvez nada que mereça a recordação. Mas de certa forma eu tenho saudades de como fui ontem.

Quando pensei o quanto minha vida mudou em um dia foi que vi o tempo que durou. Hoje já não me espanto tanto com o outro. Deveria ter feito um diário. Queria poder ler o que escrevi dez anos atrás. Queria poder saber como cheguei aqui. Agora o tom de azul mudou para lilás, isso quer dizer que mais um dia vai embora. Será que quando eu acordar amanhã terei dez anos a mais?

Se você acha que esse texto está estranho, tente recordar sua vida. Quando os clarões de tempo aparecerem você verá que o tempo também passou. Ontem você também via o céu mudando de azul para lilás.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Quando eu ficar velho.

Sentado no banco do calçadão, de costas para o movimento das pessoas que passam a correr, andar, pedalar e conversar, eu penso na vida que tive. Por volta das cinco e meia da tarde, hora que o sol cansa, dá a última espreguiçada e se recolhe para o sono devido aos trabalhadores. Afinal, de todos ele é o mais responsável. Falta apenas quando a gripe causada pela chuva o apanha. Mas o sol da minha cidade falta pouco ao trabalho. O inferno deve ter uma brisa mais amena. Eu sempre achei engraçado o cuidado que as pessoas têm com o corpo e a saúde. O fim é sempre o mesmo. Mas eu adaptei o ditado a algo que se assemelha mais ao meu vocabulário chulo, “da merda à merda”.
Não conseguir escrever um texto com início, meio e fim deixa qualquer cidadão puto. Todo mundo morreu, tenho oitenta e cinco anos. Minha mulher era estéril, não tive filhos. Cachorro, gato, peixe chupa-pedra, ou qualquer desses substitutos não geram nenhum afeto em mim. Então eu prefiro ficar só. O pior é que fiz uma cirurgia uns anos atrás que prejudicou o funcionamento da minha bexiga, mijo a cada 30 minutos. Como podem imaginar, minha autonomia é uma piada. Não posso ver um filme inteiro no cinema. Já perdi uma cartela premiada no bingo. Tudo porque mijo tanto quanto um bebê.
Nem pense que acho ruim ser velho assim. Na verdade acho revigorante. Xingo sem parar no meio da rua. Coço o saco, arroto, peido e tusso sem piedade. “Pobrezinho, já está senil”. Todo merdinha que fura uma fila ouve um “filho da puta” em troca do lugar roubado. Volto para casa com a metralhadora de obscenidades tinindo. A pior parte é não ter para quem contar os desaforos que falei. Não poder contar como é ruim urinar a cada trinta minutos. Não poder contar a tristeza que é falar apenas essas porcarias. Não ter com quem compartilhar os últimos “vá para a puta que o pariu” da minha vida.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Seis.

Em um dia ele viu. Em dois minutos se apaixonou. Em dois dias beijou. Em um mês namorou. E hoje, completam-se seis meses. Seis meses que ele acorda mais feliz. Seis meses que ele dorme com a cabeça mais leve. Seis meses que passaram muito rápido. Eu disse que estava lá, e que sabia que voltaria a escrever sobre eles novamente. Cumpro minha promessa lançando outra. A de voltar para atualizar-lhes de como eles vão indo.




Só um último comentário. Lembram-se de quando eu escrevi sobre as pernas bambas dele? Pois é, continuam assim.

quinta-feira, 14 de abril de 2011