A injustiça das escolhas permeiam minha cabeça agora. Poucas vezes tem-se a possibilidade da segunda chance. Eu sempre entendi aquela estória do mesmo homem e mesmo rio, portanto esqueça o seu argumento. Ele não me serve. Sinto-me inútil. No pior sentido da palavra. Sinto-me um boxeador ao chão. Um gato na boca de um cão. Napoleão em Santa Helena.
Logo eu. Eu que sempre fui o umbigo do mundo. Eu que sempre ditei a gravidade ao meu redor.
sábado, 26 de fevereiro de 2011
Bifurcação.
A injustiça das escolhas permeiam minha cabeça agora. Poucas vezes tem-se a possibilidade da segunda chance. Eu sempre entendi aquela estória do mesmo homem e mesmo rio, portanto esqueça o seu argumento. Ele não me serve. Sinto-me inútil. No pior sentido da palavra. Sinto-me um boxeador ao chão. Um gato na boca de um cão. Napoleão em Santa Helena.
Logo eu. Eu que sempre fui o umbigo do mundo. Eu que sempre ditei a gravidade ao meu redor.
Logo eu. Eu que sempre fui o umbigo do mundo. Eu que sempre ditei a gravidade ao meu redor.
quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011
O Velho.
Três da tarde. Esse é o horário que ele espera o dia inteiro. Toma um banho. Põe sua melhor roupa. Escolhe meticulosamente a gravata. Confere a combinação sapatos, meia, terno, camisa e gravata. Arruma o resto de cabelo que lhe resta. Escova os dentes no banheiro em forma de caixa de sapatos do quarto e sala que vive. Poderia morar em um apartamento melhor, caso mudasse para o subúrbio, mas prefere ficar perto da sua esquina.
Desce os dois andares de escada. Dá uma última lustrada nos sapatos usando a barra da calça. Brilham como um espelho. “Assim está melhor”. Compra o periódico, uma carteira de cigarros baratos, devolve as moedas ao bolso lateral da calça cinza. Enxuga o pingo de suor que ameaça escorrer pela fronte. Senta no banco de madeira já não tão branco. Olha as pessoas passarem. Confere as horas no relógio que fora de seu pai. Faltam 5 minutos.
Ao ver a condução número 338 se aproximar sente o coração palpitar. Ela desce. Jovem. Mas não jovem demais. Tem na expressão uma certa experiência, não condizente com sua pouca idade. Carrega livros. Vem ouvindo música e flutuando enquanto meche a boca no que ele imagina ser a letra que ouve nos pequenos plugues incrustados em suas orelhas. Ele ri com o canto da boca, abaixa um pouco o jornal, e através de seus óculos escuros fora de moda, vê quem quer para si. Gosta apenas de vê-la passar. Aqueles poucos segundos, 135 para ser mais exato, dão sentido à sua vida. Ela entra em casa.
Levanta, dobra minunciosamente o jornal. O conforta na articulação entre o tronco e o braço. Põe a mão no bolso e anda em direção ao Boteco mais próximo. Faz um sinal utilizando dois dedos ao garçom. Ele agora já entende e serve a dose de cachaça pedida empiricamente pelo “senhor que veste e usa terno nos olhos”. Pega as moedas depositadas previamente no bolso do conjunto e acalma-as ao balcão. Volta ao velho apartamento. Continua sua escrita. Descreve sem parar a moça. Procura novos adjetivos em uma velha gramática, também herança de seu pai. O último usado foi “cintilante”. Bebe mais, até o ponto que a embriaguez fecha seus olhos.
Repete o ritual gravata, cigarro e jornal. Olha para o relógio. Ela está atrasada. Espera por uma hora. Ela não vem. Volta para casa sem parar no bar. Abre uma nova garrafa de Cachaça. Procura adjetivos para saudade.
Desce os dois andares de escada. Dá uma última lustrada nos sapatos usando a barra da calça. Brilham como um espelho. “Assim está melhor”. Compra o periódico, uma carteira de cigarros baratos, devolve as moedas ao bolso lateral da calça cinza. Enxuga o pingo de suor que ameaça escorrer pela fronte. Senta no banco de madeira já não tão branco. Olha as pessoas passarem. Confere as horas no relógio que fora de seu pai. Faltam 5 minutos.
Ao ver a condução número 338 se aproximar sente o coração palpitar. Ela desce. Jovem. Mas não jovem demais. Tem na expressão uma certa experiência, não condizente com sua pouca idade. Carrega livros. Vem ouvindo música e flutuando enquanto meche a boca no que ele imagina ser a letra que ouve nos pequenos plugues incrustados em suas orelhas. Ele ri com o canto da boca, abaixa um pouco o jornal, e através de seus óculos escuros fora de moda, vê quem quer para si. Gosta apenas de vê-la passar. Aqueles poucos segundos, 135 para ser mais exato, dão sentido à sua vida. Ela entra em casa.
Levanta, dobra minunciosamente o jornal. O conforta na articulação entre o tronco e o braço. Põe a mão no bolso e anda em direção ao Boteco mais próximo. Faz um sinal utilizando dois dedos ao garçom. Ele agora já entende e serve a dose de cachaça pedida empiricamente pelo “senhor que veste e usa terno nos olhos”. Pega as moedas depositadas previamente no bolso do conjunto e acalma-as ao balcão. Volta ao velho apartamento. Continua sua escrita. Descreve sem parar a moça. Procura novos adjetivos em uma velha gramática, também herança de seu pai. O último usado foi “cintilante”. Bebe mais, até o ponto que a embriaguez fecha seus olhos.
Repete o ritual gravata, cigarro e jornal. Olha para o relógio. Ela está atrasada. Espera por uma hora. Ela não vem. Volta para casa sem parar no bar. Abre uma nova garrafa de Cachaça. Procura adjetivos para saudade.
terça-feira, 8 de fevereiro de 2011
"La Ritournelle"
“I've seen that road before
It always leads me here
Lead me to you door”
As influências da minha vida me trouxeram aqui. À esse texto que escrevo. Talvez se não ouvisse tanto. Ou assistisse tanto. Ou conversasse menos. Quem seria? As vezes que ouvi “The long and Winding Road” me fizeram ser mais melancólico? As vezes que ouvi Sonic Youth me fizeram mais inquieto? Ou eu simplesmente as encontrei por já ser melancólico e inquieto? As vezes parece-me que eu fui o encontrado. Elas que vieram a mim, por obra da vida.
Andar por uma rua, com a solidão de braços dados. Um cachecol que mais lembrava uma forca. A fumaça que era metade causada pelos cigarros e pelo frio. A desolação causada pela ausência de alguns que sempre imaginava comigo. Talvez só agora eu consiga desencadear os pensamentos logicamente. Consiga ver o que foi feito de mim. Sentir os pingos gelados de uma chuva fina atacarem meu rosto enquanto ouvia “It's Always a Relief”. Sair do escuro. “Has left a pool of tears”.
Voltar para onde meu coração aquece. Voltar para a vida que eu abandonei. Voltar a sorrir com todos os dentes. Voltar ao inesperado. Voltar ao decadente. Voltar ao espontâneo. Conhecê-la. Conhecer o improvável. Amar o improvável. Sair do (transitório). Andar por onde eu conheço. Onde posso sair e encontrar o que já conheço. Onde meu sangue se sente parte do ar. Aqui eu sou feliz.
Rejeito, pelo menos por agora, a possibilidade de sair. De voltar. De sentir a forca. “It always leads me here. Lead me to your door.”. Você me deu mais um motivo pra não sair. Além dos que eu já tinha. Você me deu mais um motivo para esfriar meu sangue caso abandone-a.
*O texto inteiro foi escrito por "The Long and Winding Road" e pela influência que ela tem em mim.
It always leads me here
Lead me to you door”
As influências da minha vida me trouxeram aqui. À esse texto que escrevo. Talvez se não ouvisse tanto. Ou assistisse tanto. Ou conversasse menos. Quem seria? As vezes que ouvi “The long and Winding Road” me fizeram ser mais melancólico? As vezes que ouvi Sonic Youth me fizeram mais inquieto? Ou eu simplesmente as encontrei por já ser melancólico e inquieto? As vezes parece-me que eu fui o encontrado. Elas que vieram a mim, por obra da vida.
Andar por uma rua, com a solidão de braços dados. Um cachecol que mais lembrava uma forca. A fumaça que era metade causada pelos cigarros e pelo frio. A desolação causada pela ausência de alguns que sempre imaginava comigo. Talvez só agora eu consiga desencadear os pensamentos logicamente. Consiga ver o que foi feito de mim. Sentir os pingos gelados de uma chuva fina atacarem meu rosto enquanto ouvia “It's Always a Relief”. Sair do escuro. “Has left a pool of tears”.
Voltar para onde meu coração aquece. Voltar para a vida que eu abandonei. Voltar a sorrir com todos os dentes. Voltar ao inesperado. Voltar ao decadente. Voltar ao espontâneo. Conhecê-la. Conhecer o improvável. Amar o improvável. Sair do (transitório). Andar por onde eu conheço. Onde posso sair e encontrar o que já conheço. Onde meu sangue se sente parte do ar. Aqui eu sou feliz.
Rejeito, pelo menos por agora, a possibilidade de sair. De voltar. De sentir a forca. “It always leads me here. Lead me to your door.”. Você me deu mais um motivo pra não sair. Além dos que eu já tinha. Você me deu mais um motivo para esfriar meu sangue caso abandone-a.
*O texto inteiro foi escrito por "The Long and Winding Road" e pela influência que ela tem em mim.
Isso, é verdade.
Eu que sempre fui um bom mentiroso. Mas não encare da forma errada. Nunca menti por mal. Sempre o fiz por ser a melhor solução. Evitar conflitos supostamente desnecessários. Eu nunca expurguei a mentira do meu repertório de verdades. Eu não sou desonesto. Posso ser medroso, desonesto não. Nunca menti sobre nada de relevância humana. Só as vezes não estava tudo tão bem quanto eu dizia. Digo isso a quase todos vocês. Amigos, família, que são quase um só. Mas não a você. Você não conhece esse meu lado. Com você eu sou cru. Com você, minha pele se torna invisível. Se você quiser ver, pode ver tudo que tem dentro. Entranhas, ar, tudo.
Minhas mentiras ficaram longe de você. Você está pegando um eu mais difícil. Mas verdadeiro em tudo que se possa imaginar. Desde o primeiro dia.
Minhas mentiras ficaram longe de você. Você está pegando um eu mais difícil. Mas verdadeiro em tudo que se possa imaginar. Desde o primeiro dia.
Nota.
A vida me preenche de improbabilidades.
(As opiniões expressas nesse blog definem estritamente TODAS as do autor)
(As opiniões expressas nesse blog definem estritamente TODAS as do autor)
quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011
O homem sem nome.
Depois da cirurgia de correção do septo nasal, esperava acordar na sala de recuperação. Ao invés disso, acordou em um quarto cinzento deitado em uma cama pequena com o colchão tão fino que dava para sentir as ripas de madeira que davam sustentação a armação de metal tubular da cama. O simples movimento de levantar fez a cama exprimir um barulho tão alto quanto irritante. Viu uma porta, ao abri-la encontrou uma despensa abarrotada de latas de feijão, um abridor e uma colher. No outro canto do quarto um vaso sanitário amarelado e sujo, uma pia minuscula e uma saída de encaixe para um chuveiro. O chuveiro mesmo não existia. Era isso. Exceto por um pequeno buraco na parede.
A iluminação do quarto inteiro dependia do buraco. Esse buraco dava para um apartamento vizinho. Normal. Padrão para a época. Tentou gritar por socorro, mas nada aconteceu. Era como se o homem que bebia uma cerveja assistindo algo na televisão simplesmente não ouvisse. Nem a mulher que aparecia de tempos em tempos trazendo as louças que seriam postas para o jantar. Gritou até ficar rouco. Pelo tamanho da barba calculou ter dormido por três dias.
O desespero deu lugar ao conformismo no terceiro mês. A barba já cobrira todo o seu rosto. Cortava as unhas com os dentes. Sentia gosto de pedra ao comer o feijão. Parou de falar para não contaminar a lembrança que tinha do tom de voz das pessoas que mais gostava, porém o tempo fez eles se tornarem mais confusos. Parou de procurar explicações do porque estar preso de uma forma tão cruel, até os assassinos têm com quem conversar. Não lembra de ter feito mal a ninguém. Pelo menos não que valha tamanha punição. Satisfazia sua curiosidade sobre o mundo vendo os vizinhos de buraco. Sabia que era hora de dormir quando parava o movimento na sala através do buraco. Queria ler alguma coisa, ouvir uma música. Queria sentir um toque. Sonhava todas as noites com um toque. Algumas vezes com um simples encontrão enquanto esperava o metrô.
Um dia perguntaram-lhe seu nome através do buraco. Respondeu. Isso se repetia no que ele achava ser uma vez por ano. Contou trinta e sete indagações iguais. Na trigésima oitava não soube responder, já não sabia seu nome. Não conseguia lembrar como falá-lo. Talvez pela solidão, ou talvez pelo mal de Alzheimer. A idade havia chegado. Perdeu todas as lembranças. Acordava diariamente sem saber onde estava. As latas de feijão continuavam a aparecer. Se perguntava sempre se ainda estava vivo. Desejava a morte como se deseja uma mulher. Esqueceu como rir. E como chorar também. Transformou-se em um fantasma vivo. Era assim que se sentia. Sentiu que passou e não foi visto. Sentiu-se um mendigo, um marginal. Um daqueles que não se vê enquanto andamos na rua.
Acordou um dia com uma arma ao seu lado. Apenas uma bala no tambor. Pensou por dois dias e disparou contra a parede. Agora poderia ver o outro lado com os dois olhos. Notou que os buracos eram semelhantes. Iguais se vistos de longe. Alguém fez o primeiro buraco assim como ele. Alguém, assim como ele, teve mais medo do que não conhece do que entusiasmo com a chance de sair da situação mais deplorável do mundo e preferiu apenas um pouco mais de luz, e de vida alheia.
A iluminação do quarto inteiro dependia do buraco. Esse buraco dava para um apartamento vizinho. Normal. Padrão para a época. Tentou gritar por socorro, mas nada aconteceu. Era como se o homem que bebia uma cerveja assistindo algo na televisão simplesmente não ouvisse. Nem a mulher que aparecia de tempos em tempos trazendo as louças que seriam postas para o jantar. Gritou até ficar rouco. Pelo tamanho da barba calculou ter dormido por três dias.
O desespero deu lugar ao conformismo no terceiro mês. A barba já cobrira todo o seu rosto. Cortava as unhas com os dentes. Sentia gosto de pedra ao comer o feijão. Parou de falar para não contaminar a lembrança que tinha do tom de voz das pessoas que mais gostava, porém o tempo fez eles se tornarem mais confusos. Parou de procurar explicações do porque estar preso de uma forma tão cruel, até os assassinos têm com quem conversar. Não lembra de ter feito mal a ninguém. Pelo menos não que valha tamanha punição. Satisfazia sua curiosidade sobre o mundo vendo os vizinhos de buraco. Sabia que era hora de dormir quando parava o movimento na sala através do buraco. Queria ler alguma coisa, ouvir uma música. Queria sentir um toque. Sonhava todas as noites com um toque. Algumas vezes com um simples encontrão enquanto esperava o metrô.
Um dia perguntaram-lhe seu nome através do buraco. Respondeu. Isso se repetia no que ele achava ser uma vez por ano. Contou trinta e sete indagações iguais. Na trigésima oitava não soube responder, já não sabia seu nome. Não conseguia lembrar como falá-lo. Talvez pela solidão, ou talvez pelo mal de Alzheimer. A idade havia chegado. Perdeu todas as lembranças. Acordava diariamente sem saber onde estava. As latas de feijão continuavam a aparecer. Se perguntava sempre se ainda estava vivo. Desejava a morte como se deseja uma mulher. Esqueceu como rir. E como chorar também. Transformou-se em um fantasma vivo. Era assim que se sentia. Sentiu que passou e não foi visto. Sentiu-se um mendigo, um marginal. Um daqueles que não se vê enquanto andamos na rua.
Acordou um dia com uma arma ao seu lado. Apenas uma bala no tambor. Pensou por dois dias e disparou contra a parede. Agora poderia ver o outro lado com os dois olhos. Notou que os buracos eram semelhantes. Iguais se vistos de longe. Alguém fez o primeiro buraco assim como ele. Alguém, assim como ele, teve mais medo do que não conhece do que entusiasmo com a chance de sair da situação mais deplorável do mundo e preferiu apenas um pouco mais de luz, e de vida alheia.
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